A Gostosa

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A Gostosa

Postby Danilo » 02 Mar 2007, 23:04

A gostosa

Sempre que entro num recinto público - pode ser padaria, cartório ou velório - olho em volta, procurando a gostosa. Não o faço por desejo, carência, narcisismo ou outro simples reflexo de minha banal condição masculina. A gostosa é um acontecimento literário.

Ela pode ser loira ou morena, alta ou baixa, preta, branca, japonesa ou búlgara, não importa: a gostosa é um estado de espírito. Ou, se preferir outra palavra, tão esgraçada por programas de esporte, revistas jovens e propagandas de achocolatados: uma atitude.

Hoje fui ao cartório. Havia ali, sentados, entre os motoboys e os aposentados, a esperar sua senha apitar no painel uma mulher que parecia a Claudia Cardinale em 'Era uma Vez no Oeste'. Estava discretamente vestida, de cabelo preso, xale sobre os ombros.

Não era a gostosa. A gostosa não deixa dúvidas. Chegou cinco minutos depois, de calça jeans desbotada agarrada à bunda, combinando com um top apertado que espremia os peitos e deixava entrever um sutiã preto.

Assim que entra, com seu rebolar, o cheiro de perfume e o movimento dos cabelos, ela emite a todos, como que por telepatia, a incontornável informação: atenção, a gostosa chegou.

Muda tudo. Cada um sabe exatamente qual o seu lugar social diante da gostosa. O aposentado de jaqueta bege olha de soslaio e, quase triste, suspira. As moças do cartório franzem imperceptivelmente a sombrancelha, regozijando-se de suas virtudes feitas de crachás, cafés e conjuntinhos pretos. Um rapaz de óculos, meio nerd, olha para o teto, olha para o chão, as mãos lhe sobram. Todos arriscam um olhar em direção à gostosa, mas ela dá apenas uma conferida panorâmica, mascando o chiclete - displicentemente, como quem macera corações - e retira a senha.

Então, do conjunto desconjuntado de homens, do meio de aposentados e míopes, dos barrigudos e coxos, dos médios, dos graves e dos agudos, surge o Macho da Gostosa. Pode ser um motoboy bem apessoado, um playboy, um pequeno empresário novo-rico de correntinha de ouro. Não acontece nada. Eles apenas se olham e, tacitamente, todos sabem, a gostosa é dele. Tristeza para alguns, alívio para outros. Depois, a gostosa vai para um lado, ele para o outro, não sobra ali nenhum ator daquelas bem-ensaiadas cenas, apenas um perfume doce no ar e a voz da mocinha virtuosa chamando o próximo: cinqüenta e quatro, cinco-quatro!

(Antonio PRATA. A gostosa. Suplemento Guia de O Estado de São Paulo, nº 282)
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Postby junior » 03 Mar 2007, 14:15

hahahahaha, antes de ver que o texto não era seu, juro que estava pensando: "Porra, olha o Danilão com dotes literários" hahahahahaha... Sério, buscando a gostosa nos lugares, etc, etc hahahahah :lol: :lol: :lol: :lol: :lol: :lol: :lol: :lol: :lol:
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