Cadê o Roque Júnior que tava aqui?
20.05.2006 | Minha reação instintiva foi reclamar a ausência de Roque Júnior. Tentei ser contundente, mas, inteiramente desaparelhado para defender o futebol do zagueiro do Bayer Leverkusen, acabei dizendo que ele era um sujeito bacana, que eu havia inclusive lido numa revista sobre sua simpatia pelas idéias de Nietzsche, “pode crer, o cara é niilista, fala alemão e aquele cabelinho dele, pelamordedeus, vai fazer falta à Seleção rumo ao hexa”. Quando dei por mim, todos no bar prestavam atenção no que eu dizia para três ou quatro na minha mesa. Ninguém apoiou ou contestou. Estavam atônitos, boquiabertos, evidentemente duvidando de minha masculinidade, acho que jamais tinham visto alguém exaltando daquele jeito as virtudes do Roque, que, como se sabe, foi cortado da Seleção às vésperas da Copa, Parreira o trocou por Cris, do Lyon. “Esse aí”, tentei buscar adesões, “além de careca, nunca foi a uma aula de filosofia, quer apostar?” Não quiseram, já estava mesmo na hora de ir embora. Tchau!
Dia seguinte acordei com aquela desagradável sensação de não lembrar direito da noite anterior. Sabia muito bem o que disse, mas não conseguia entender por que disse, por que tomei as dores do Roque Júnior daquele jeito épico. Esquece! Botei a culpa no vinho da casa e fui à luta das minhas notinhas – está muito difícil, de tão fácil, fazer piadas boas no Brasil. Na redação, com a TV ligada à espera da decisão da Copa dos Campeões, achei que ver Ronaldinho Gaúcho jogar era só o que faltava para tirar de vez o Roque Júnior da cabeça.
Acontece que por uma dessas surpresas da caixinha do futebol, o grande herói do Stade de France naquele Barcelona 2 x 1 Arsenal, que deu o título ao time catalão, foi o... Vocês sabem, foi o Belletti. De repente, sem mais nem porquê, lá estava eu, exaltado, acusando Parreira de, como se não bastasse o Roque Júnior, não levar para a Alemanha o lateral direito do Barça. “O Belletti é craque com C maiúsculo, vai fazer falta na Copa, anota aí o que estou dizendo!” Devo ter enchido o saco dos meus colegas de trabalho, coitados! “Fora Parreira!” – eu falava, evidentemente, sozinho. Um “fora!”, dito assim meio envergonhado, foi o máximo que consegui de um funcionário da administração do site.
Roque Júnior e Belletti não são, evidentemente, jogadores cuja ausência se possa reclamar na Seleção, mas que graça tem Copa do Mundo sem uma boa discussão de botequim, de preferência com metade da mesa esculhambando o técnico canarinho? Foi assim com Felipão, Zagallo, Lazaroni, Cláudio Coutinho, Feola, Aimoré Moreira... “Bota ponta, Telê!” Técnico de Seleção em Copas do Mundo são historicamente responsáveis pelas grandes manifestações da passionalidade do brasileiro com o futebol. Antes de qualquer conquista, a graça é meter o pau nas escolhas do comandante do time, sem detrimento de elogios rasgados à suas preferências em caso de vitória na Final. Foi ou não foi bom demais falar mal do Felipão até ele virar o grande herói do penta?
É claro que sem Romário por perto fica mais difícil criar polêmicas na Seleção, mas isso que está acontecendo agora nunca se viu nem no tempo que Dondon jogava no Andaraí e, evidentemente, não foi convocado pra coisa nenhuma. Parreira deu um nó tático na conversa fiada, prestando um serviço inestimável à falta de assunto. Nenhum torcedor, comentarista esportivo ou motorista de táxi, em sã consciência ninguém tem nada a dizer sobre a lista de jogadores brasileiros que vão à Copa da Alemanha. São esses mesmo, e ponto. Fred ou Nilmar, francamente, tanto faz. A única possibilidade de uma discussãozinha gostosa – a não convocação de Rogério Ceni – a contusão de Marcos tratou de debelar.
De forma que, a 20 dias da Copa, estamos inteiramente sem assunto para bater uma bola no bar. A Internet a todo instante da manchete às bobagens que o Pelé diz nessas horas, coisas do gênero “o Brasil é favorito e favoritos em geral não ganham copas do mundo”. Ahã! Se ninguém fugir da concentração em Weggis, cidadezinha suíça que fica no caminho do hexa, vai ser duro ler os jornais até 9 de junho, quando a bola rola na Alemanha. Não fosse o Cláudio Lembo batendo o bolão que está batendo nas primeiras páginas, não sei não!
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